domingo, 18 de abril de 2010

Eu queria dizer-te …

Mas imóvel, fogem-me as formas e em mim todos os átomos sentem tudo....
Vê que lá fora há sol e gente...
E essa pequena que dança na calçada foi eu quem pariu...
E ela sente medo e dor... e não dança quando percebe a falta da flor...
Ela se desalinha e tem seu porquê ...é que ela não gosta de ver o lixo transmudar-se em um pote de ouro...
Diz-me ela: não há o que doar que não pelo ralo? E eu me calo...
Pede ela,ao Deus que construiu, que invente um lugar mais claro que o meio da praça por onde agora lhe vem de passeio a mulher que na cacunda parece não poder mais sustentar a cria que ainda tem à boca um bico rosa.
... se ele fosse branco, talvez tivessem elas mais paz...
Segue aquela mulher que por certo deve ser a mãe, vê-se pelo esforço que faz para seguir com seus sapatos maiores do que os seus pés tão do mundo.
Seria ela portadora de tal amor capaz de andar metros infinitos com seus cabelos ao vento e sua criança a lhe pesar, agora nas ancas?...
Ela segue...
Está protegida pelos olhos desse sol que lhe brilha...pelo salto de seus sapatos pretos e grandes...pelo nosso olhar que lhes seguiu por breves raios...agora nós seguimos...parece que é assim que deve ser feito...olhar e seguir...seguir acompanhando o passo e o barulho dos seus sapatos na areia ...torcendo para que eles continuem a lhe calçar a alma e os pés. E eu torço que não lhe falte o sol...
E eu torço para ter dela um dia tal coragem...
Vê que já não é meio-dia?
Ao meu lado a pequena segue a me perguntar coisas do mundo...
Quanto é cem mais cem?
De onde vem as sementes?
Por que não existe sapatos do tamanho dos pés daquela?
Por que comer lixo?
Ela tem tantas perguntas … e parece não se acostumar em não fazê-las!

Janete Flores

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